segunda-feira, 30 de maio de 2011

Quinto Espelho: traição na Torre da Alta Feitiçaria


Mais uma vez o grupo de aventureiros experimentava a solidão daquela sala gelada, diante do vulto cada vez mais materializado de Lord Soth. A noite havia se espreitado pelo horizonte e só restavam poucos faixos de luz perdidos naquele céu nebuloso e triste de Sithicus. A fortaleza Nedraagard ganhava tons ainda mais melancólicos com a chegada do frio vespertino. Os companheiros conversavam entre si. Faltavam apenas mais 2 espelhos para despertar completamente o cavaleiro caído. E era exatamente isso que preocupava Lothar e seus companheiros...

Beren olhava calmamente a corneta de ouro que carregava consigo, examinando sua beleza. Embora os elfos de Ankara não fossem apaixonados por peças feitas de metais nobres como os Anões, era inegável que a beleza do artefato possuía algo de hipnótico. Ainda mais se lembrar-mos que aquele instrumento era capaz de convocar uma besta da magnitude de Kellendros, o Dragão Azul. Os heróis resolveram entrar no quinto Espelho da Memória. Mas Beren, em mais um de seus delírios egoístas resolveu entrar no sexto espelho. Naquela hora, o vulto de Lord Soth movimentou a mão calejada, em um espasmo mudo.

As imagens foram clareando e o grupo se viu numa ampla escadaria de pedra em espiral, no interior de uma torre. Ao fim da subida, chegava-se a um salão alto, de onde escutava-se uma discussão. Todos trajavam túnicas sacerdotais, embora empunhassem também suas armas tradicionais. Os aventureiros aproximaram-se dos ruídos e puderam ver o que se sucedia: o cavaleiro de espada em punho apontando para um corpo atirado no chão era, sem dúvida, Lord Soth. O sangue do cadáver borrava as finas tapeçarias do local. Era uma mulher vestindo uma armadura azulada completamente estilhaçada. O que restou do estandarte negro e dourado acusava sua alta posição militar. Era Kitiara Uth Matar. Diante do corpo da Dama Azul, um elfo magro vestindo uma túnica verde-escura, em postura defensiva. Ao seu lado, um conhecido do grupo: Thannis meio-elfo. O guerreiro também empunhava sua arma, mas havia nele um ar de hesitação bem diferente da bravura cega que o grupo conhecera nas ruas de Palanthas. Atrás dos dois havia uma luz clara como uma manhã, em formato oval. Lothar sussurou que aquilo era, provavelmente, um portal mágico! Ouvindo a discussão, o grupo percebeu que Lord Soth estava ali para reclamar o corpo de Kitiara. Thannis e Dalamar, um aprendiz de feiticeiro, defendiam o cadáver contra a investida do cavaleiro negro. Mas era evidente que estes temiam a sua ira.

Lord Soth levantou a voz contra seus oponentes e apontou-lhes a larga espada de forma ameaçadora. Quando o blasfêmo cavaleiro preparava-se para dar um passo adiante, os heróis interviram na discussão. Surgindo da escadaria em espiral, o grupo se colocou entre Thannis meio-elfo, Dalamar e Lord Soth. O lorde negro surpreendeu-se por um breve instante, mas não interrompeu sua carga sobre o bando de intrusos que impediam-o de levar o corpo de sua amada Kitiara, a Dama Azul. Thannis meio-elfo também postou-se diante de Soth, mas não aparentava reconhecer os heróis de ocasiões anteriores. O lorde negro então falou:

- Thannis, seu covarde! Não adianta esconder-se atrás de seus amigos tolos...Entregue o que me pertence por direito! Entregue-me o corpo da Senhora dos Dragões, Kitiara Uth Matar!!! Eu não esperei tanto para ser desafiado por um bando de cães miseráveis...

A voz daquele ser decadente era grave como uma tuba. Entristecida, mas cheia de fúria e morte como o cheiro que atrai os abutres ao campo de batalha. Sua armadura chamuscada pelo fogo dos deuses estampava ainda aquela insígnia infame: a Rosa Negra. Thannis meio-elfo deu mais um passo adiante, postando-se ao lado do corpo sem vida de sua antiga companheira.

- Você que é um rato traiçoeiro, Lord Loren Soth! Você seguiu Kitiara pela floresta, até qui, esperando o momento exato para traí-la. Com que direitos você reclama o corpo dela? Sua desonra aumenta a cada dia, cavaleiro negro.

Soth lançou um olhar infernal sobre aquele meio-elfo insolente, embora soubesse que aquela era a mais pura verdade. Mas o que era a verdade dentro de suas próprias fantasias e recordações violadas?

- Traidor? Foi seu amigo Dalamar que a matou a instantes atrás, meu caro inimigo! Você e seus companheiros devem me entregar o corpo dela ou morrer pela lâmina de minha espada! Não seja ridículo, Thannis meio-elfo, com sua fidelidade tardia. Para Kitiara você não passou de uma aventura infantil...


Enquanto os guerreiros se confrontavam com palavras e intimidações, o portal que brilhava atrás dos aventureiros emanava um calor insuportável. Se alguém mirasse seu interior, perceberia uma paisagem desolada. Uma imensidão avermelhada de areia e pedras desgastada por temperaturas vulcânicas sob um céu carmesin se estendia até os confins da visão. Também era possível enxergar uma trilha de pegadas que seguia ao horizonte. Alguém havia entrado naquela paisagem infernal, traçando uma jornada aos limites do desconhecido...

Beren sentia seu corpo flutuar entre o ar quente de um templo em ruínas. Ele se sentia como um espírito atormentado e sem lar. Junto a ele estavam outras almas condenadas a esmoecer naquele cenário sem tempo. Foi quando ele escutou passos pesados e o barulho de aço. Sua visão estava um tanto embaralhada, mas foi possível compreender que das escadas amontoadas daquele lugar infernal vinha chegando alguém. O ambiente do sexto Espelho da Memória era o temível Abismo, o limbo infernal para onde os adoradores de Takhisis, o Dragão de Sete Cabeças, a Senhora da Escuridão, vão ao final de seus dias na terra. Esse era o ambiente representado nas memórias de Lord Soth.

O cavaleiro apareceu na entrada do templo, vestindo sua tradicional armadura negra. dessa vez ele apresentava sua aparência tradicional: seus olhos eram apenas dois pontos vermelhos incandecentes. Seu corpo exalava um cheiro de queimado e morte. Soth esticou a mão para o alto, segurando um medalhão ornamentado com uma enorme safira preta. Sussurando como um pássaro, ele repetiu:

- Venha até mim Kitiara. Sua alma me pertence! Sente-se ao meu lado pela eternidade e governemos juntos o mundos dos vivos e dos mortos...

Subitamente, um dos vultos imateriais que se contorcia naquele calor infernal começou a flutuar na direção da jóia. O lorde negro abriu um sorriso de satisfação profunda: - Finalmente!

Tudo aconteceu muito rápido, embora parecesse uma eternidade naquela paisagem inóspita. Beren acordou novamente no salão gelado de Nedraagard. Só lhe restava esperar pelos companheiros.

Enquanto isso, no interior do quinto espelho, a discussão tornava-se combate iminente. Lord Soth foi tomado por uma fúria desenfreada e ergueu a larga espada contra seus opositores. O grupo buscou cercar o cavaleiro, desferindo golpes por todos os lados. no entanto, cada um que era atingido pela espada de Lord Soth sentia um sopro gélido aterrorizante. Dimitre e Thynnus haviam sido golpeados. Thannis realizava uma espécie de duelo particular, em meio a saraivadas de espadas. Lothar tentava não encarar o morto-vivo diretamente, mas também acabou sendo ferido. Lord Soth era um espadachim muito experiente e quase imbatível. Todos estavam atordoados quando Soth derrubou Thannis meio-elfo e preparava-se para o golpe fatal. Foi quando ouviu-se um grito bestial vindo do outro lado da sala. Era Dalamar que segurava o cadáver de Kitiara próximo ao portal. Lord Soth se viu paralisado diante da ameaça do elfo em jogar o corpo da Dama Azul ali, naquela entrada para o Abismo. Seria o fim. Mas o lorde negro não largou a espada. Respirou profundamente e resmungou:

- Você não ousaria fazer isso, Dalamar! Você não passa de um covarde e sabe disso...

Nessa hora o elfo encheu-se de ódio e num ato desesperado, atirou o corpo de Kitiara, a Senhora dos Dragões, no portal a sua frente. O corpo pareceu virar cinzas instantaneamente e um cheiro de carne queimada prencheu o salão. Lord Soth deixou a espada escorrer pelos dedos até cair no chão. Thannis, que sangrava muito, abriu um sorriso vitorioso. A cena pouco a pouco se desfazia. Os aventureiros estavam de novo abandonados diante do trono decadente de Nedraagard. Apenas um espelho os separava do despertar do Cavaleiro da Rosa Negra

sexta-feira, 27 de maio de 2011

Quarto Espelho: a Batalha de Palanthas


Recuperados de mais um mergulho na doentia mente do Cavaleiro da Rosa Negra, os companheiros entreolhavam-se, buscando reconhecer uns nos outros o que lhes restava de coragem. O silêncio frio da sala foi quebrado quando Capsoniwon avançou em direção ao quarto espelho. A elfa virou-se para os companheiros e disse sem hesitar:

- Vamos! Só faltam mais 3 espelhos...

Os aventureiros então a seguiram e começaram a encarar o terceiro Espelho da Memória. Logo todos se viram transportados para outro espaço, com outras roupas e outra aparência. Parecia que estavam em uma cidadela. Havia grande agitação nas ruas: pessoas correndo desesperadas por todos os lados, animais em disparada, camponeses fechando suas casas, milícias marchando pelas ruas e cavaleiros armados avançando na contracorrente da população em revoada. Quando o fogo surgiu nos primeiros telhados de palha da cidade é que os aventureiros perceberam que se tratava de um ataque violento ao local. E eles foram lançados em meio aquele caos...o cigano Dimitre resmungou então:

- Essa memória deve ser a Batalha de Palanthas! Lord Soth e Kitiara estão invadindo esta cidade!!! Ele deve estar fantasiando uma vitória aqui...devemos derrotá-lo!

Em meio a estrondos e sons de batalha, nos limites dos gigantescos muros da cidade surgia uma imagem dantesca: uma espécie de fortaleza flutuante se aproximava lentamente dos céus da cidadela. A medida que se aproximava foi possível definir melhor o que eram aquelas criaturas que voavam em torno da fortaleza. Para o pavor generalizado de todos, era um exército enfurecido de Dragões Azuis e Negros! Um risco de pavor atravessou os heróis por alguns segundos. Logo em seguida, enquanto passavam por uma rua em chamas, perceberam que o portão principal de palanthas havia cedido e uma horda de cavaleiros morto-vivos realizava ensandecido assalto sob o comando de um homem forte, vestindo uma pesada armadura de Solamnia. Sem dúvida, aquele era o memso homem que lhes desafiou em todos os espelhos desde então: Lord Loren Soth de Dargaard.


O infâme cavaleiro negro fitou os heróis com um ar desafiante. Lord Soth chamou 4 cavaleiros consigo, ensaiando uma investida. Um pequeno bando de draconianos, criaturas meio-humanas, meio-dragões acompanhavam o destacamento pelo ar. Foi quando os aventureiros perceberam que alguém os estava seguindo. Um meio-elfo trajando armadura, usando uma brilhante coroa de ouro e com espada em punho se colocava em posição de combate.

- Olá forasteiros! Se não querem morrer aqui mesmo é melhor sairem do caminho daquele cavaleiro. Mas se estiverem dispostos a defender Palanthas com suas vidas, saquem suas espadas. Aquele é Lord Soth e seu exército de mortos...Eu sou Thannis, o meio-elfo.


O homem interrompeu o que dizia ao cruzar olhares com Capsoniwon. Embora a elfa estivesse trajando um capuz de algodão grosso, à moda dos camponeses locais, seus olhos ainda eram idênticos aos da Dama Azul, a ambiciosa guerreira que liderava o ataque contra Palanthas. Após um segundo de hesitação, o meio-elfo tornou a concentrar-se na batalha que se aproximava. Os draconianos chegavam em rasante contra o grupo. Capsoniwon, Thynnus e Lothar sacaram seus arcos e desferiram uma saraivada de setas sobre os despresíveis répteis voadores. Beren e Dimitre sacaram suas espadas e se preparavam para o assalto da cavalaria. O meio-elfo também aguardava o melhor momento, esperendo pacientemente pela aproximação do batalhão montado no meio daquela larga via de pedras. Lord Soth parecia reconhecer o meio elfo. O cavaleiro negro cuspiu no chão ao ver seu velho inimigo mais uma vez no campo de batalha. Sua voz soou como gelo na madrugada, quando ele apontou para Thannis e reclamou:

- Entregue-me a coroa, meio-elfo. Ou hei de massacrar você e todos os seus amigos. Palanthas cairá ainda esta noite, tolo.

Thannis não moveu um músculo. Apenas lançou um olhar de quem já havia derrotado o cavaleiro negro em alguma outra ocasião do passado. Enquanto isso, os Dragões cruzavam os céus da cidade, destruindo torres, incendiando telhados e derrubando muralhas que obstaculavam sua fúria.

Chegado o momento do ataque, a coroa usada por Thannis meio-elfo começou a brilhar. Com um salto veloz, desferiu um golpe certeiro no ombro de Lord Soth. Os draconianos feridos a flechadas caiam sobre outros cavaleiros mortos, tornando a cena mais confusa e violenta. Beren acertou um dos companheiros de Soth. Dimitre transpassou com sua espada um draconiano caído que agonizava. Lothar já sacava seu machado e recitava louvores à Enlil, enquanto Thynnus e Capsoniwon ainda atiravam flechas para todas as direções. Pouco a pouco aqueles que Lord Soth julgava um bando de adversários fracos e desonrados haviam derrotados quase toda sua retaguarda. Mas mesmo sozinho, o ar de morte que aquele homem carregava fazia o mais destemido guerreiro ter pesadelos...

Lord Soth sinalizou para um dos Dragões Azuis vir em seu socorro, enquanto ensaiava mais uma manobra ofensiva. Os aventureiros se aproximavam, em formação de defesa. Lothar gritou ferozmente aos amigos:

- Temos que derrotá-lo antes do ataque do Dragão!!! É assim que isso deve terminar...

Thannis meio-elfo olhou sem entender uma palavra dita pelo sacerdote. Mesmo assim, concordava que a única maneira de evitar o ataque da besta reptiliana era aproximar-se de seu mestre, Lord Soth. O Cavaleiro da Rosa Negra esporou o cavalo e partiu em direção ao grupo, sem demonstrar o menor temor pela sua desvantagem numérica. Sacudiu a espada no ar, sobre a cabeça e acertou o meio-elfo em no ombro, devolvendo a ofensa anterior. Thannis soltou um rugido animalesco, como se tivesse os olhos furados com brasa. O guerreiro livrou-se do que restava do escudo que carregava naquele braço. O ferimento que aparecia estava congelado, queimando a pele profundamente. Mas o meio-elfo não se abateu. Enquanto se recobrava do golpe a coroa voltava a brilhar.

Nos céus, aquele Dragão Azul parecia mais ameaçador a cada segundo. A besta começou a contorcer o pescoço, preparando uma baforada mortifera que não pouparia qualquer um naquela praça forte. Quando Lord Soth se virava, preparando uma nova manobra, os companheiros avançaram alguns metros, diminuindo o caminho para o assalto do cavaleiro. Thannis aproveitou-se da manobra dos forasteiros para correr em direção a Soth, com uma velocidade incrível.

Pela retaguarda, o Dragão Azul começava um vôo rasante direcionado contra o grupo. Pelo lado frontal, Lord Soth preparava sua montaria para mais um ataque alucinado. Os aventureiros estavam em uma encruzilhada. Somente um golpe certeiro e a benção de todos os deuses os salvariam do extermínio. Mas os deuses demonstram piedade para com os mortais que não tremem em situações como estas. Lord Soth já estava quase em cima do grupo quando Capsoniwon tirou o capuz, olho-o nos olhos e lançou duas flechas em seu tórax. O lorde negro se viu paralisado naquele mesmo momento: Kitiara, a Dama Azul, que liderava aquele ataque, havia passado para o lado dos rebeldes??? Sua amada companheira havia traído Takhisis para lutar ao lado de seu antigo amante, Thannis meio-elfo??? Havia traído ele próprio e suas hordas de dragões e morto-vivos??? Tudo embaralhou-se na mente do Cavaleiro da Rosa Negra. Nesse momento, Beren se jogou no chão e enterrou a espada na carne podre da montaria de Lord Soth. O cigano Dimitre golpeou o punho do lorde negro, que acabou soltando aquela maldita espada no chão. Thannis acertou um golpe em cheio no elmo de Soth. O cavaleiro foi lançado e caiu de costas no meio da rua. Seu sangue negro ainda espalhava-se pelas vielas imundas de Palanthas quando a cena começou a evaporar-se. Logo estavam todos de volta a sala do trono de Nedragaard, pensando em quão bravo era o tal Thannis meio-elfo...